Todos os evangelhos sinóticos narram a
história da mulher do fluxo de sangue, que constitui um incidente no caminho de
Jesus para a casa de Jairo, príncipe da Sinagoga. Uma mulher que sofre por 12
anos de uma hemorragia. Que gasta tudo com médicos em busca de sua cura... sem
sucesso.
Para entender o sofrimento daquela mulher,
que não é apenas físico, mas também psicológico, precisamos entender o que a
Lei de Moisés previa para uma mulher numa situação daquele tipo, isto é, com
fluxo constante de sangue:
“Também a mulher, quando manar o
fluxo de seu sangue, por muitos dias fora do tempo da sua separação ou quando
tiver fluxo de sangue por mais tempo do que a sua separação, todos os dias do
fluxo da sua imundícia será imunda, como nos dias da sua separação. Toda cama
sobre que se deitar todos os dias do seu fluxo ser-lhe-á como a cama da sua separação;
e toda coisa sobre que se assentar será imunda, conforme a imundícia de sua separação.
E qualquer que as tocar será imundo; portanto, lavará as suas vestes, e se
banhará com água, e será imundo até à tarde.” Lev 15.25-27
A doença tinha um caráter de impureza, para
cujas leis de higiene era exigido que a pessoa com tais sintomas tivesse que se
isolar. Quem a tocasse ou em que ela tocasse seria imundo. O isolamento social
traz uma angústia, uma tristeza por ter suas potencialidades tolhidas. E o seu
toque transformava tudo em impuro, imundo.
Ela então “ouve falar de Jesus”. A fama do Mestre de Nazaré em sua
simplicidade, mas em seu testemunho de “Mestre vindo da parte de Deus”, chega
aos ouvidos da mulher sofrida e esgotada. Surge então uma nova esperança.
Stenio Marcius capta a expectativa da mulher na canção “Alegria sem medida”:
Eu vou poder amar de novo como antes
E celebrar a recompensa dos amantes
Tomar no colo os meus filhos sem receio
Voltar a ser de minha casa adorno e
esteio
Quero correr feito menina entre as
parreiras
E me deixar levar nas velhas corredeiras
Quero esquecer os doze anos e os
tormentos
E que gastei inutilmente os meus
proventos
Sinto chegar uma alegria sem medida
Sinto que agora vou saber o que é vida
Serei curada de maneira inconteste
Se eu com fé tocar na orla de suas vestes”
A fé descortina a possibilidade do
sobrenatural, abre caminho para uma nova lógica, até então nunca cogitada. A
mulher crê que será curada se tocar na orla das vestes de Jesus. Ora como seria
possível um toque que possibilitaria a cura, se até então tudo que ela tocasse
se tornava impuro?
Uma lógica nova, um toque que purifica,
transforma, cura... o toque em Cristo.
Os leprosos constituíam um outro grupo de
pessoas isoladas. Não podiam ter contato com as pessoas, muito menos tocá-las.
Jesus tocou o leproso e o curou (Mt 8.3).
Cristo estabelece uma nova lógica: Toques
que curam, que transformam, que saram... quando o que se espera são toques que
transmitem impureza, imundície.
O que transmite o nosso toque? Ou quando
somos tocados, o que acontece conosco? Somos corrompidos? Nos tornamos sujos
tal qual aquele que nos tocou? Somos contaminados pela impureza da maldade,
maledicência, imoralidade, incredulidade...?
Não era assim com Jesus! O seu toque ou o
toque de alguém que o tocava, não mudava sua natureza e característica, isto é,
não o tornava impuro, ou doente. Pelo contrário, quem o tocava, ou quem ele
tocava é quem era transformado! Por isso ele podia ir à casa de Zaqueu, ou
comer com os amigos publicanos de Mateus e não se transformar em um deles, em
vez disso, mudar suas vidas.
Mas Jesus sabia exatamente quem ele era, e qual era sua missão! E nós? Sabemos quem somos? Sabemos qual a nossa missão neste mundo? Isto é definitivo para o resultado de nosso toque, ou do toque de alguém. Nosso toque ou transforma alguém ou resulta em nossa transformação. O verdadeiro seguidor de Cristo pode tocar e ser tocado, porque é alguém transformado para transformar o mundo!
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