terça-feira, 27 de agosto de 2013

Para piorar tudo é evangélica...

   Lendo as páginas amarelas da VEJA (28/08/13) me deparei com uma entrevista com o cantor Lobão.  Atirando farpas contra seus companheiros de atividade artística como Gil,  Caetano e Chico Buarque; Lobão faz o tipo artista azedo e arrogante, que, aos 55 anos diz de si mesmo que “é um bom escritor e que o seu melhor ainda não chegou”.
    Eu ainda me lembro da própria VEJA falando de Lobão nos anos 80. Ele era o retrato da contracultura, com o seu cabelão e suas tiradas irreverentes. Segundo ele mesmo, naquela época “cheirava quantidades bíblicas de pó”. Em 2010 ele contou a sua história no livro “50 Anos a Mil”. Drogas, tentativas de suicídio, e conflitos com amigos e inimigos recheiam o relato autobiográfico.

   Queria chamar a atenção para o subtítulo da entrevista: “O cantor carioca afirma que a era PT sepultou a tolerância e a diversidade de pensamento e que os protestos de rua pareciam ‘desfiles de escola de samba”.
   Não se espera de uma língua ferina e revoltada como a de Lobão amenidades e elogios... A entrevista se iniciou com os posicionamentos do velho roqueiro acerca dos protestos populares (que ele comparou com desfile de escola de samba). Não sei por que cargas dágua o entrevistador citou o papel desempenhado por Marina Silva no cenário político nacional. Lobão então proferiu pérolas preciosas que mereceram o destaque da página:

   Parece que a irreverente criatividade de Lobão encantou os editores que esperavam exatamente isso de alguém que pudesse ser um porta-voz da contra-corrente. O neologismo “clorofilocrático teocrático” então deve ter merecido vibrantes aplausos.
    Na resposta  seguinte, em sua crítica ao bloco que governa o país Lobão critica: “Não há mais espaço para a tolerância e para a diversidade de pensamento”.
    Não pretendo fazer uma análise de toda a entrevista. Mas preciso apenas fazer algumas considerações sobre  a expressão de nosso sensível artista, envolvendo a ex-senadora Marina Lima: ...para piorar tudo, é evangélica. Lobão, isso me incomodou! Claro que você dirá que isso foi dito pra incomodar mesmo, para provocar.
    Mas é que tudo parece tão louco, quanto o próprio pensamento do Lobão. Quando num bloco eu critico uma personalidade e procuro desqualificá-la totalmente, caracterizando-a como destrambelhada, e para piorar tudo, é evangélica... eu não sei até que ponto essa é uma afirmação tolerante, e que admite a diversidade de pensamento. Sim, porque no parágrafo seguinte as ações do governo são criticadas e execradas por  não haver mais liberdade de pensamento e tolerância. Claro que o Lobão se vê como um indivíduo tolerante, e um paladino da liberdade de pensamento.
    E ele quer que todos  sejamos tolerantes com a sua irreverência, com a sua rabugice, com a sua arrogância, e também admitamos a sua liberdade de pensamento que lhe permite dizer que “a prosódia de Chico Buarque lhe dá urticária”...
   Lobão, e por que você não é tolerante com as crenças de Marina Silva? Por que a militância ambientalista de Marina a faz uma destrambelhada? Por que a sua crença evangélica é colocada como o ápice do destrambelhamento? Isso também não me parece ser muito respeitoso da liberdade de pensamento...  
    A revista obteve o que desejava:  afirmações controversas ‘Contra a “abundância da mesma opinião”. Mas imagino que o caminho para se estimular o pensamento divergente não seja humilhando a posição do outro, nem sendo paradoxalmente intolerante... São bonitos os discursos prontos de tolerância de artistas e políticos. Feia é a intolerância da práxis, que faz pulsar uma teoria muito diferente do discurso...
     Quem quiser ler sobre Lobão, compre o livro dele... não quero falar da biografia desse reconhecido artista. Mas quero pensar em Marina Silva: seringueira, empregada doméstica, ambientalista, historiadora, pedagoga, vereadora, deputada estadual, senadora, Ministra do Meio Ambiente por 5 anos... para piorar tudo, é evangélica!


   Você está certo Lobão, Marina é destrambelhada... como eu, e como milhares de trabalhadores deste país, que nunca assaltaram, nunca se drogaram, pegaram no pesado, não vivem seus dias a mil, mas vivenciam as rotinas e os desafios diários, cuidam de seus pais, apreciam boa música... É isso! Sou destrambelhado como a Marina, e para piorar tudo, sou evangélico!