quarta-feira, 10 de julho de 2013

O Deus que se dá a conhecer: a experiência de Moisés e Elias com a Glória (Kabod)


      Como qualquer outro conhecimento, o conhecimento de Deus não se dá de imediato, é um processo, envolve a história das pessoas, e os atos de Deus. É claro que conhecer a Deus é algo muito mais complexo de que conhecer uma casa, um livro, um vizinho. Conhecer pessoas é mais complicado do que conhecer coisas, porque as pessoas podem não mostrar-se quem de fato elas são.
     Conhecer a Deus diz respeito a um entendimento de um  Ser transcendente, a apreensão da natureza do Senhor do Universo. Não nos parece algo muito simples.
     Os agnósticos e os céticos afirmam que o conhecimento de Deus é algo impossível. Na verdade, o conhecimento de Deus só é possível, porque Ele se dá a conhecer.  Por isso Deus diz a Jeremias:  Mas o que se gloriar, glorie-se nisto: em me conhecer... (Jer 9.23).  O Grande Deus, o Criador de todas as coisas se aproxima e começa a conversar conosco através das palavras e verdades das Escrituras, e do seu agir no nosso dia-a-dia.

     Não se trata apenas de ler a bíblia. Trata-se de ler com o desejo de nos aproximarmos de Deus.  É lendo com a seguinte indagação: Como é que Deus me fala aqui e me chama a um amor mais generoso? A uma relação diferenciada com Ele? Uma leitura da Palavra que resulte em maior conhecimento de Deus consiste em ler estando atentos interiormente às moções do Espírito de Deus na nossa vida exterior e interior... assim, estaremos nos deixando ler por Deus!
         Vejamos o que aconteceu com Moisés:
      Como um menino hebreu que cresceu no palácio do Faraó, aprendendo da ciência da época e conhecendo todas as divindades do panteão egípcio, Moisés sabia muito pouco do Deus de seus pais.
     Vivendo no deserto, parece-nos que tornou-se um homem apreciador da natureza, cuja lembrança do Deus de Israel era muito vaga em sua memória. Por isso, quando algo sobrenatural lhe é mostrado ele acha que é algo comum, e não tem discernimento para perceber que neste algo espantoso, está o mistério de Deus! (Êx 3.1-4) Mesmo assim, por pura curiosidade ele se aproxima da sarça ardente, sem saber que está dando o seu primeiro passo no conhecimento de Deus. Registre-se que Deus se revela e o ATRAI.
      A aproximação de Moisés é profana, leviana. Ele se aproxima daquele misterioso fenômeno de forma comum, como se fosse algo próprio da natureza.  De repente, percebe que há algo mais, quando ouve uma voz: “Não te aproximes daqui. Tira as sandálias dos pés, pois o lugar em que estás é terra santa.” (Êx 3.5)  Moisés precisava discernir o sagrado, do profano. Diante do Deus que se revela ele não pode portar-se levianamente.
     Deus se apresenta a Moisés, e este percebe que trata-se de uma apresentação formal do Deus de seus pais, que se dá a conhecer a ele:
      Eu sou o Deus de teu pai, o Deus de Abraão, o Deus de Isaque e o Deus de Jacó. (Êx 3.6) Neste momento, Moisés é tomado de temor e reverência e esconde  o seu rosto, entendendo estar diante da majestade Eterna (Êx 3.6)
    Numa apresentação, saber o nome do interlocutor é importante. Moisés pergunta: Qual o nome do Deus de meus pais? (Êx 3.13) Deus responde: EU SOU O QUE SOU !! (Êx 3.14) Os israelitas indagariam:  Deus se apresentou a você? Então como ele se apresentou? Que novo conhecimento ele permitiu que dEle você tivesse?
    Eu sou o que sou, ou Eu sou aquele que é. A revelação do nome, não é apenas uma verdade teológica, é um apelo a uma resposta de fé por parte de Moisés e do povo de Israel.
   Vamos confiar nEle? Vamos entregar nossas vidas e nosso destino a Ele? Vamos obedecê-lo?
    A seguir, Deus trouxe uma maior tranqüilidade a Moisés quando realizou uma série de sinais. Os sinais endossariam a presença e o poder do Deus Invisível.
    Moisés e Aarão tornam-se porta-vozes de Deus, e entregam ao Faraó e a Israel a mensagem que o Senhor lhes manda.  Mas nem sempre os resultados são os esperados.  Quando as expectativas são frustradas, Moisés volta-se para o Senhor indagando, por que?
    A  resposta de Deus revela sua longanimidade, sua paciência com o homem.  Deus revela sua Graça e fala da história da sua caminhada com Israel, um povo que inicialmente, não lhe conhecia pelo nome (Êx 6.3), fala de sua misericórdia, de promessas de salvação...
    Mas Israel está demasiado sofrido e angustiado, para que pudesse aproveitar naquele momento, o Deus que se revela para seu povo (Êx 6.9). Moisés e o povo testemunharam a liberação por Deus das 10 pragas do Egito. Celebraram a páscoa, conforme orientação divina, prepararam-se para a partida... e puseram-se a caminho.
    Em frente ao Mar Vermelho testemunharam novamente a intervenção maravilhosa de Deus. Diante da grandeza dos feitos divinos, Israel teme e crê (Êx 14.31), enquanto Moisés louva e canta.
   Deus continua agindo, mas também entrega a Moisés determinações, orientações, ordenanças, leis escritas. O caminho do deserto é um caminho de aprendizado, de expansão do conhecimento de Deus. Moisés e os anciãos de Israel sobem o monte, e têm uma visão de Deus (Êx 24.10-11)... Depois Moisés sobe sozinho e fica com Deus, no meio da nuvem (Êx 24-12-18).
    Havia um lugar especial onde Deus conversava com Moisés. Era a Tenda do Encontro, chamada também de Tenda da Revelação, lá ocorriam as conversas de Deus com Moisés (Êx 33.7-11). A esta altura, o conhecimento de Deus que Moisés apresentava já era muito amplo. As conversas aconteciam como os diálogos entre amigos. (Êx 33.11)  
    Moisés poderia estar acomodado com o nível de conhecimento já obtido. O que já era muito considerável! (Acomodação no aprendizado, é quando atingimos um ponto no qual achamos que já dominamos todas as verdades, ou seus aspectos principais, e paramos de nos empenhar no estudo da palavra, no aprofundamento do conhecimento de Deus. Ficamos repisando as mesmas verdades desprezando a riqueza de conhecimento que nos espera em Deus e na sua Palavra).
     Mas, não!! Moisés desejava mais...
     Agora me mostres os teus caminhos para que eu te conheça..  a fim de que continue a achar favor aos teus olhos (Êx 33.13)... Deus lhe responde: Irá a minha presença contigo para te fazer descansar (Êx 33.14)... e os pedidos de Moisés para aprofundamento do seu conhecimento de Deus são atendidos pois, ele achou graça aos olhos do Senhor, e era conhecido pelo nome (Êx 33.17).
     Ainda não satisfeito, Moisés pede: Rogo-te que me mostres tua glória (Kabod)... (Êx 33.18) A que glória Moisés se referia? Afinal ele já vira a glória do Senhor (Êx 16.7), em tantas outras ocasiões!
      Tua glória (KABOD)
     Vale a pena, entender por um momento o que Moisés queria dizer por tua glória. Não há dúvidas que o termo  hebraico kabod pode ser traduzido por glória na medida em que comunica a concepção de algo ou alguém que tem “peso” ou até mesmo uma posição de honra e dignidade. O termo, como substantivo e verbo, pode ser empregado tanto em relação ao ser humano como em relação a Deus. Quando usado em relação ao ser humano expõe o valor de seus bens materiais como também seu crédito e estima. Quando relacionado a Deus revela seu poder e autoridade.
    Alguns autores concordam que Israel experimentou a  kabod de Deus como um fogo devorador sobre o cume do Sinai. O esplendor da  kabod divina era tanto que nem mesmo Moisés pôde contemplar.
    Entretanto, o pensamento de  kabod,  no Pentateuco não se resume apenas a uma coluna de fumaça ou fogo, mas também está associado a completa magnificência ou grandiosidade da  presença de Deus. Era isso que Moisés buscava... Ver Deus de forma plena!  Ampliar o seu conhecimento dEle!
    A resposta do Senhor é:
      Farei passar toda a minha bondade diante de ti e te proclamarei o meu nome... e agirei com GRAÇA (terei misericórdia de quem eu quiser ter misericórdia e me compadecerei de quem eu quiser me compadecer)  (Êx 33.19)
     O Kabod de Deus se revela a Moisés como Graça... Bondade... Misericórdia... Não é fogo, não são demonstrações de grande força... não.  Um desfile de bondade, de graça, e do Nome Santo de Deus. Esta experiência, definitivamente bastaria, para Moisés. Séculos depois, João escreveria, que em sua essência, Deus é Amor (I Jo 4.8)
      O homem que um dia foi atraído por uma manifestação sobrenatural de Deus sobre uma sarça, que queimava e não se consumia, agora gozava do privilégio de passar diante de si, a glória (kabod) de Deus. Muito mais do que manifestação de poder, Moisés testemunhava agora a essência do Deus de Israel, Deus de Graça e de Bondade!
     Às vezes continuamos girando em torno da sarça, em nossa curiosidade e empolgação... Há algo maior, há algo mais completo... busquemos ver a Glória (Kabod)  do Senhor.
    O que aconteceu com Elias? Um novo Encontro, e um conhecimento diferente de Deus
    Elias, era um profeta com uma caminhada interessante no conhecimento de Deus.  Acabara de vencer um embate com os baalistas, e grande vitória espiritual fora obtida diante do povo de Israel.
    Mas agora, ameaçado pela rainha Jezabel, Elias teme e busca a morte em sua tristeza. No deserto um anjo vem servi-lo e após alimentá-lo convoca-o a continuar a caminhada. (I Rs 19.7). Sobe ao monte e entra numa caverna para pernoitar. Ali o Senhor lhe aparece e ele testemunha uma natureza em fúria!!!
      Terremotos, ventos, fogo...
          A passagem do Senhor pela montanha foi carregada de sinais naturais. Elias já conhecia todas essas manifestações. Deus já se mostrara para ele como o Deus que envia fogo do céu (que consumiu o altar do holocausto, na prova do Monte Carmelo, e também consumiu os capitães e soldados que foram enviados para prendê-lo), como o Deus que controla as chuvas sobre a terra, que domina sobre as aves do céu (que um dia lhe serviram pão e carne)... mas naquele momento, Elias não necessitava de mais uma demonstração sobrenatural de poder de Deus. Mas naquele momento Elias não conseguia enxergar Deus em qualquer dos sinais... por isso diz o texto: O Senhor não estava no terremoto... no vento... no fogo (I Rs 19.11-12).
     Ele também ansiava pela Kabod de Deus... Mas esta Kabod não estava ali...
     Nossa visão de Deus, às vezes é extremamente reduzida. Estamos atrás dos terremotos, do fogo, dos furacões, dos terremotos despedaçados... das demonstrações sobrenaturais de poder. Que já conhecemos, que já testificamos. Mas buscar um aprofundamento no conhecimento do  Senhor, não é a busca por estas coisas... é mais que isso.
    Para que haja um verdadeiro encontro com o Senhor, e deste encontro resulte aprendizado, um novo conhecimento de Deus, é necessário algo mais que a revelação divina. É preciso que  o homem consiga enxergar o Deus que dele se aproxima.  Tem a ver com a presente necessidade humana, e sua disponibilidade em ver o invisível!!
      Elias estava carente da presença, da essência divina...
     O Kabod de Deus se revela a Elias como um Deus acessível de forma pessoal e inteligível à necessidade humana:    Uma voz mansa e suave (I Rs 19.12). Essa voz também reflete a bondade e graça divinas...
   Elias cobriu o rosto com a capa (I Rs 19,13), ao sair da caverna e ficar frente a frente com a kabod de Deus. Por que ele fez isso?  Porque desde Jacó (Gn 32.30), passando por Moisés, sabia-se que contemplar o Senhor significaria o fim do homem.
   Mas o cobrir o rosto nos fala de reverência, de temor. Nossa relação com o Senhor precisa estar pautada na reverência.  A reverência é mais do que uma emoção; é uma maneira de compreender, é um ato de discernimento sobre um sentido maior do que nós mesmos.
    A reverência reflete-se no Ai de mim de Isaías (Is 6.5). É o que sentimos quando deparamos com o mistério e com a grandeza de Deus:
      Poderás descobrir as profundezas de Deus? Poderás descobrir a perfeição do Todo-Poderoso? A sabedoria de Deus é tão alta quanto o céu. Que poderás fazer? Ela é mais profunda do que o Sheol! Que poderás saber? Ela é mais extensa que a terra e mais larga que o mar... (Jó 11.7-9)
      Na grandeza de Deus, em sua kabod, está o sublime. Aquilo a que tudo o mais se torna pequeno se lhe for comparado!!! Essa sublimidade gera a reverência em nós.
     Elias era reverente, temente... a reverência pelo Senhor é o começo da sabedoria (Sl 111.10). A bíblia não prega a reverência como uma forma de resignação intelectual, não diz que a reverência é o propósito da sabedoria... é o caminho... o início do caminho. Um homem não temente não desfruta da companhia divina!! Ele não consegue discernir o sagrado, o mistério, a kabod de Deus.