terça-feira, 14 de outubro de 2014

Hannah Arendt - Ela marcou minha história!

      Quem consultou o Google hoje deparou-se com um Doodle curioso: O desenho de uma senhora delicada empunhando com segurança uma caneta na mão esquerda e folhas de papel na mão direita, reclinada em sua mesa de trabalho, emoldurada por livros.


   Quem por curiosidade clicou no Doodle soube que era uma homenagem aos 108 anos de nascimento de Hannah Arendt. Mas quem foi  Hannah Arendt?
   Generais foram retratados empunhando suas espadas, reis os seus cetros... escritores e pensadores são lembrados também com seus instrumentos que lhes conferiram poder e lhes imortalizaram. É o caso de Hannah Arendt.
   Devo confessar que tenho um carinho especial por ela. Uma senhora de olhar atento, de aguda perspicácia e de notável sensibilidade. Tenho algumas de suas obras traduzidas  no vernáculo e disponíveis nas livrarias nacionais.


   Não sei  bem como foi nosso primeiro encontro. Só sei que a conheci através de um dos seus escritos mais famosos: Eichmann em Jerusalém, um relato sobre a banalidade do mal. Vivia um momento especialmente delicado e a leitura desse livro de Arendt potencializou minha indignação, minha revolta... abriu meus olhos para situações do cotidiano... conscientizou-me de atitudes monstruosas que Eu estava me tornando protagonista!
    Todos deveriam ler esse relato de Arendt. Afinal de que se trata?
     Eichmann foi um alto funcionário da estrutura nazista que atuava na logística da máquina da morte. Com a queda do Reich e a derrota alemã fugiu para Argentina onde viveu até ser capturado em Buenos Aires, em 11 de maio de 1960, e transportado para Israel onde foi levado a julgamento em Jerusalém, em abril de 1961.
    Hannah estava lá, fazendo a cobertura do julgamento para a revista The New Yorker. Das observações e reflexões acerca do julgamento veio à luz Eichmann em Jerusalém.


    O acusado tinha dificuldade de entender porque estava ali, afinal ele sempre fora um cidadão respeitador das leis, e executou as ordens de seu superior hierárquico  (Hitler) o melhor  que pôde.  “Ao longo de todo o julgamento, Eichmann tentou esclarecer, quase sempre sem nenhum sucesso que ele não era nenhum sujeito imoral. Quanto a sua consciência, ele se lembrava perfeitamente de que só ficava com a consciência pesada quando não fazia aquilo que lhe ordenavam – embarcar milhões de homens, mulheres e crianças para morte, com grande aplicação e meticuloso cuidado.”
      Arendt  registra que “quanto mais se ouvia Eichmann, mais óbvio ficava que sua incapacidade de falar estava intimamente relacionada com sua incapacidade de pensar, ou seja, de pensar do ponto de vista de outra pessoa.”
     A não ser por sua extraordinária aplicação em obter progressos pessoais, ele não tinha nenhuma motivação... Ele simplesmente nunca percebeu o que estava fazendo. Ele não era burro. Foi pura IRREFLEXÃO – algo de maneira nenhuma idêntico à burrice – que o predispôs a se tornar um dos grandes criminosos desta época.
    A leitura deste livro me deixou profundamente perturbado. Não estamos diante da “Solução Final”, mas estamos diante de mega estruturas econômicas e religiosas que às vezes nos engajam em suas engrenagens e nos convidam a não pensar, a apenas agir.  Podemos nos tornar monstros, seres malignos, travestidos de bons funcionários, excelentes executivos, empregados premiados... como Eichmann.
       Arendt me resgatou do pragmatismo utilitário do sistema em que estou inserido, e me deu uma sacudida para que eu voltasse a vida... Aí me lembro de outro livro dela:  A Condição Humana. Ela nos convida à reflexão, e ressalta que a irreflexão, pensada como a imprudência temerária ou a irremediável confusão ou a repetição complacente de verdades que se tornaram triviais e vazias, parece ser uma das principais características do nosso tempo. Ela nos propõe apenas refletirmos sobre o que estamos fazendo.
  Apenas... isso muda tudo! Grande Hannah! Homenagem muito bem merecida!


     

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