quinta-feira, 28 de julho de 2011

Conversas sobre o Livro de Habacuque

1.       Os questionamentos de uma pessoa de fé
    Muitos textos bíblicos apresentam uma atualidade que surpreendem os mais céticos e incrédulos. O livro do profeta Habacuque é um deles. O nome exótico, sonoro e pouco utilizado (Quem conhece alguém chamado Habacuque?), esconde um texto riquíssimo em beleza estética, profundidade espiritual e atualidade teológica.
   Em nossa conversa sobre Habacuque, começamos com os questionamentos do profeta, encontrados no primeiro capítulo:
   “Até quando, Senhor, clamarei eu, e tu não me escutarás? Gritar-te-ei: Violência! E não salvarás? Por que razão me mostras a iniqüidade, e me fazes ver a opressão?” (Hab 1.2-3) “Por que olhas para os que procedem aleivosamente, e te calas quando o ímpio devora aquele que é mais justo que ele? E por que farias os homens como os peixes do mar, como os répteis, que não têm quem os governe?” (Hab 1.13-14)  
   O questionamento surge quando os fatos aparentam alguma incoerência. Quando a lógica do cotidiano parece comprometida. Quando o raciocínio humano não encontra razoabilidade nos fatos com os quais se depara. Habacuque questiona porque não há resposta divina ao seu clamor. Ora, diante do clamor humano espera-se a resposta do céu. Quando a resposta não vem, surge o questionamento: “Até quanto, Senhor, clamarei eu, e tu não me escutarás?”
    Diante da inércia do Eterno Regente do mundo, ante às injustiças e desmandos da sociedade humana, a lógica do crente brada: “Por que calas quando o ímpio devora aquele que é mais justo que ele?
    Indagações... questionamentos...

    Para muita gente a definição bíblica de fé parece estar calcada em certezas, em impossibilidade de questionamento: “A fé é o firme fundamento das coisas que se esperam, e a prova das coisas que se não vêem...” (Hb 11.1). Este conceito, belo, apropriado e suficiente por sinal, nos indica que a fé confere sentido à crença de coisas futuras e invisíveis.  Garante-nos que não estamos loucos quando afirmamos que cremos no mundo porvir, bem como que Cristo está assentado à direita de Deus intercedendo por nós. A fé é o que confere sensatez e coerência às nossas afirmações, mesmo que estas não encontrem amparo na metodologia científica.
    Mas esta definição não indica que o crente (aquele que tem fé) não questione, não faça indagações. É importante que tenhamos em mente que existem indagações e indagações. Existem indagações basilares, que caso existam é indicativo que o indivíduo ainda não tem consolidada a sua fé, a sua crença. Por exemplo, quem questiona a própria existência de Deus não pode estar nos domínios da fé, ainda encontra-se no universo da incredulidade. Afinal, “é necessário que quem se aproxima de Deus creia que ele existe...”(Hb 11.6).
    Existem indagações que surgem de um coração cheio de fé. Existem questionamentos que partem da pureza e sinceridade de quem confia no Senhor e quer manter sua fé no Todo-Poderoso. Habacuque era assim... Não entendia por que certas coisas eram do jeito que eram, e não tendo as respostas indagava ao Todo-Poderoso.
     Por que temos tanta certeza da fé de Habacuque?
     Por causa de sua atitude no versículo 1 do capítulo 2. Após uma saraivada de questionamentos, Habacuque toma uma decisão:  Eu me colocarei sobre a minha torre de vigia; ficarei sobre a fortaleza e vigiarei, para ver o que Ele me dirá e o que terei como resposta à minha queixa”.
     Humildade, sinceridade, fé, eis o que está por trás desta atitude. Alguma coisa Deus me dirá, algo para manter coerente o meu pensamento, algo para acalmar meu espírito em ebulição, algo para confirmar que eu não estou enlouquecendo. Vou esperar... vou esperar pela resposta divina.
     E a resposta veio. Não com as respostas ao questionário de Habacuque, mas com uma clareza fora do comum, com uma simplicidade óbvia, um óbvio ululante (como ele não tinha entendido isto ainda?): “O Justo viverá por sua fé” (Hab 2.4). A fé confere ao crente um sentido à existência que dispensa as explicações e respostas aos questionamentos. As indagações considerar-se-ão satisfeitas pela afirmação da fé. Por isso, o justo, vive por sua fé.
     Lembrei do meu avô, Justo... já não está mais conosco... viveu por sua fé, deixando-nos o exemplo!

2 comentários:

  1. Muito interessante o texto. Por sinal vc anda meio sumido ... Mas a fé é mesmo o q nos faz viver sem sofrer tanto com as indagações q permeiam o nosso dia-a-dia. A propósito, conheço um Habacuque sim. Pernambucano.. Crente.. Mas fico com uma indagação: o q é ululante?
    Felipe

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  2. Gostou do "ululante"? Óbvio ululante foi uma expressão usada por Nelson Rodrigues, que resultou na publicação de um livro com o mesmo nome no fim da década de 60. Ululante é o que uiva, o que grita, brada. Óbvio ululante é o óbvio que grita, que se mostra, é o óbvio que só não vê quem não quer. A partir deste mote Darcy Ribeiro escreveu um texto muito conhecido: "Sobre o Óbvio".

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