sábado, 16 de abril de 2011

Relacionamento e tempo: uma constatação

Naquele dia ela me chamará meu marido (meu homem especial); não me chamará mais meu Baal (meu amo, meu senhor) (Os 2.16)

A forma como cada cônjuge trata um ao outro retrata um pouco do atual estágio do relacionamento de ambos. Por que atual estágio? Porque todo o relacionamento muda ao longo do tempo. Isto é indiscutível.
Muda porque nós mudamos! Muda porque muda a nossa forma de ver o mundo! Muda a nossa interação com a vida. Muda o mundo, tudo muda, o mundo muda. E mudamos nós. O problema não é a mudança, o problema é quando a mudança se dá para pior.    
O tempo... O tempo é um componente implacável no nosso relacionamento. Em algum momento a pele não mais será tão fresca, as rugas insistirão em driblar o Renew e teimosamente denunciar que já não somos os garotos e garotas de outrora... E os cabelos? Insistem em novos fios brancos, que mesmo pintados insistem em crescer apontando para uma raiz branquinha... O tempo... Como dizia um jovem que não chegou a envelhecer: O tempo não pára!   
E no relacionamento o reflexo do tempo está em toda a parte. Muito além das rugas e dos cabelos brancos, ou mesmo dos quilos extras. O tempo está no humor que já não é mais o mesmo. Está na língua que pode ficar ferina. Está nos olhos que deixaram de ver apenas a beleza e passaram a valorizar os pequenos erros, os equívocos.
Dizem que com o tempo os animais crescem e mudam de espécie... O Meu Gatinho pode se transformar num “Cachorro”, e a Minha Gatinha pode se transformar numa “Jumenta”.
Como dissemos, este tratamento reflete o relacionamento. E o relacionamento muda, mas não precisa ser para pior... E se estiver ruim, pode ainda ser novamente melhorado.  
No texto de Oséias,  que retrata um relacionamento conjugal simbólico entre o povo de Israel e Deus, percebemos a promessa de uma renovação no relacionamento. Uma esposa que chama o esposo de meu senhor (meu baal), passaria a chamá-lo de meu marido, meu homem. A passagem de “meu senhor” para meu marido indica que a ênfase é colocada mais na intimidade do vínculo conjugal do que na subordinação da esposa ao esposo.
Com o tempo o relacionamento pode tornar-se insosso, uma troca de obrigações, e nestas obrigações alguém passa a ser o senhor, o amo, o proprietário... E ficam juntos, mas não por causa do carinho, mas pela obrigação...
 No texto de Oséias, o que norteia o relacionamento não deve ser a relação contratual da aliança, o foco não é a obrigação, a responsabilidade (meu senhor)... o foco é o amor, é o carinho, o vínculo amoroso (meu marido, meu homem...).
Se pudéssemos viajar no tempo... o que veríamos?
          Um casal apaixonado dizendo "sim". Estou certo? Mas o tempo...
           O tempo foi passando... O tempo, sempre o tempo... e a rotina... e a dureza da vida. E o cuidado dos filhos, que se tornaram adolescentes, jovens... e a exigência profissional, e o tempo vai ficando exíguo, passando rápido demais, e não mais se tem tempo, e se conversa pouco, se comunica pouco. E os problemas vão se avolumando. E o marido torna-se distante, e o carinho é substituído pela obrigação. Fazer amor é substituído por fazer sexo, inclusive aludindo-se à determinação bíblica para o casal: não defraudeis um ao outro...
         E agora os pronomes mudaram, o tratamento endureceu... É... parecia tudo um mar de rosas, mas descobrimos que rosas tem espinhos... E há pedras no caminho. Descobrimos que além da lua de mel, há doçura sim, mas da rapadura. E rapadura é doce, mas não é mole, não! 
 Quem foi que te disse que a vida é um mar de rosas? Estava certo! É mesmo um mar de rosas, mas não esqueça que rosas tem espinhos. E o fardo é pesado e precisamos levá-lo, a jornada é longa, e não podemos ficar no caminho. Casamos para ficar juntos... até que a morte nos separe. E rapadura é doce, mas não é mole, não!
 Hoje somos desafiados a exprimir em gestos, em atitudes, a renovação deste amor, deste relacionamento. Demonstremos com um gesto, com um olhar, e não apenas hoje, mas sempre, vivamos atitudes de amor... pois o amor tudo espera, tudo suporta...
Naquele dia me chamará meu amor, minha querida, meu amado, formosa minha, bem, benzinho... Love...

sábado, 9 de abril de 2011

Velhice x Civilização

   Chovia muito hoje de manhã. Eu estava dirigindo e na minha frente um carro andava devagar. Impaciente, pensei: deve ser um velho. Dito e feito, constatei ao ultrapassar grosseiramente o “velho lento”, e corri em busca do “tempo perdido”.
    Depois que o motorista “velho” ficou para trás comecei a pensar: Podia ser meu pai... poderia ser eu daqui a uns anos. E por que a impaciência? E por que a ponta (do iceberg) de discriminação?
   Constato que integro a parte culta da sociedade, com graduações que se enfileiram, cursos que se empilham, títulos que se sobrepõem, um status estabelecido... Definitivamente alguém que deveria ter assimilado a civilização. A etimologia nos indica que civilização vem do latim civis, que significa cidade.  Civilizado é alguém que aprendeu a viver na cidade, com outras pessoas.
    Estou sendo civilizado em minha impaciência no trânsito com o motorista idoso? Não obstante formação superior  que indica anos e anos nos bancos escolares ainda não sou um homem civilizado...  Agi como um homem das cavernas... um pré-histórico. Mas agi como alguém fruto da minha época: uma civilização que abriu mão dos valores, do respeito em troca do sucesso, da velocidade, da prosperidade a todo custo.
     É tempo de refletir e repensar.  Ainda posso pensar como jovem, agir e sentir como tal. Mas o tempo está passado. Breve perderei os reflexos, a acuidade visual não será a mesma... serei um velho. Um velho que não aprendeu a ter paciência!
    O Eclesiastes chama a velhice de dias difíceis nos quais a visão escurece, os ouvidos se fecham, as pernas não sustentam mais o corpo, os dentes caem... Mas isto dito de uma forma poética, profunda:
“...antes que o sol e a luz, a lua e as estrelas se escureçam, e as nuvens voltem depois da chuva; quando os guardas da casa tremerem, e os homens fortes andarem curvados, e cessarem os moedores por já serem poucos, e os que olham pelas janelas se escurecerem; quando as portas da rua se fecharem; quando diminuir o barulho do moinho e acordares com o canto dos pássaros e silenciar o som de todos os cânticos; quando temeres a altura e te assustares pelos caminhos; quando florescer a amendoeira, o gafanhoto for um peso e o desejo já não se despertar...”  (Ec 12.1-5)
    Pensei como critico quem joga lixo na rua do carro, quem faz manobras proibidas... e digo: não são pessoas civilizadas... Do alto da minha civilização, da minha cultura, me vejo bárbaro, ignorando a lentidão do velho. Confesso: também não sou uma pessoa civilizada.
    Sou cristão, mas neste momento estava longe de mim as palavras do Livro Sagrado: Amai a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a ti mesmo... Tudo o que quiserdes que os homens vos façam fazei vós também a eles...
    Constato também que é muito fácil apontar o erro alheio... como dizia Jesus: Tira primeiro a trave do teu olho, para depois olhares o argueiro do olho do teu irmão.
    Acho que estou no caminho da mudança... Confissão e arrependimento. Ver o mundo de outra forma, e dentro em breve poder dizer com o poeta:
     “Ando devagar porque já tive pressa...
     Levo este sorriso porque já chorei demais!”
     Finalizo com uma música em homenagem ao “Velho”.  É dedicado, no meu caso, ao meu Velho Pai, que no trânsito de Recife deve causar muita angústia nos motoristas impacientes e “civilizados”. Senhores, lembrem-se: Vocês irão envelhecer!!!